quinta-feira, 4 de junho de 2009

Fábricas antigas do Brasil - I.N.A


A história da Indústria Nacional de Armas é no mínimo bem colorida, e começa longe do Brasil no início da Segunda Guerra Mundial, quando os alemães invadiram a Dinamarca. Nesta oportunidade lá estava, em missão técnica, um oficial do nosso Exército: Plínio Paes Barreto Cardoso. Os dinamarqueses confiaram a ele alguns projetos de armas (inclusive o de uma metralhadora leve), que são trazidos por ele ao Brasil, para longe das mãos dos nazistas. Finda a Guerra, restituídos os projetos, o Dansk Industri Syndikat cede por gratidão os direitos da submetralhadora Madsen modelo 1946. Assim em 1949, presidida pelo então General R-1 Plínio Paes, é fundada a Indústria Nacional de Armas - INA, no bairro de Utinga, na cidade de Santo André, Estado de São Paulo.


A sub-metralhadora INA, em calibre .45ACP, adotada pelo Exército Brasileiro, com sua coronha articulada na posição aberta (foto: Manual de Operação EB-1956)

O carro chefe de sua produção sempre foi a submetralhadora M1950 (uma modificação da já citada Madsen M1946, sendo as diferenças principais da original dinamarquesa a mudança do calibre, de 9 mm Luger para o 45 ACP, embora isso não fosse propriamente um problema, pois dizem que a própria Madsen fez protótipos nesse calibre. Além disso, a alavanca de manejo foi transferida da parte de cima da culatra para a lateral direita. Posteriormente surge o modelo 53, com o alojamento do carregador mais longo e reforçado. Estas armas foram padrão, por longos anos, no Exército (de 1950 a 1972) e nas polícias brasileiras. A sub-metralhadora INA possuía uma cadência de cerca de 600 tiros por minuto, não tinha dispositivo de tiro seletivo e funcionava com o princípio de ferrolho (culatra) aberto (embora a sua relativamente baixa cadência de tiro permitisse que um atirador, com certo treino, desse rajadas curtas; bastava para isso ter alguma intimidade com o gatilho da arma).

A arma também não permitia o disparo com uma só mão: uma tecla de segurança, posicionada junto ao retém do carregador, tinha que ser pressionada com a outra mão, obrigatoriamente, para que a arma disparasse. O peso da arma era de 3,400 Kg, comprimento total de 74,9 mm e comprimento de cano de 214 mm.

Ainda deve-se ressaltar que esta submetralhadora granjeou uma fama, digamos que injusta, entre os seus usuários, de ser pouco confiável em ação, pois em seu uso ocorriam muitas falhas de tiro (negas), chegando ao ponto de que as iniciais do fabricante (I.N.A.) se tornaram uma cruel alcunha: "Isto Não Atira". Verdade seja dita, a culpa era da munição .45 ACP nacional, de baixa qualidade, munição esta que inclusive acompanhou a arma quando da sua entrega às forças policiais, piorando assim a fama da arma, devido à idade dos componentes dos cartuchos.


Vista explodida da arma, onde se nota a extrema simplicidade. A armação é de aço estampado, que se abre em duas metades articulada pelos mesmos parafusos que fixam a coronha, de tubo de aço. A troca de cano nesta arma era operação bastante simples.

Revólver INA em calibre .38SPL, modelo de exportação para a Interarms, USA

A Indústria Nacional de Armas se destacou na produção de armas que ficaram bem populares no Brasil, como a conhecida série dos revólveres “Tigre”, baseados no design dos Smith & Wesson mod. 10 (Military And Police), em calibre .32 S&W Long, com várias versões da localização do desenho do citado felino, na lateral da armação, variando ora para o lado esquerdo, direito, ou de frente (ironicamente, o “Tigre” era chamado de tudo, menos tigre: ”onça”, ”leopardo”, “pantera”, ou coisa pior: “gato”, nos meios mais leigos).

A partir de 1966 surgem os raros exemplares em .38 SPL com 2, 3 ou 6 polegadas de cano, sendo bastante exportados principalmente para o mercado norte-americano. Na época, haviam muitas restrições dos militares quanto aos calibres para uso pelos civis no Brasil, mas mesmo assim a INA chegou a produzir protótipos de um revólver em calibre .357 Magnum que, infelizmente, não chegou a linha de produção normal.


AS PISTOLAS INA


A INA Chanticler, em cal. 6,35mm Browning (.25 Auto) - desenho do autor

A INA fabricou também uma pistola semi-automática de ação dupla, o modelo "Chanticler", que na verdade era uma versão com algumas modificações da pistola CZ-45, da afamada firma tcheca Česká Zbrojovka, e no mesmo calibre da original, o 6,35mm (uma versão maior desta arma, em 7,65mm, não saiu do protótipo). Curiosamente, Chanticleer ou Chanticler é o nome de um galo esperto que aparece nas fábulas medievais dos “Contos de Canterbury” - tal como em “Chanticleer e a raposa” e, de fato, a marca de um galo estilizada aparece estampada no plástico da tala de empunhada esquerda desta pistola.

Outra curiosidade sobre a Chanticler era que o 1º tiro (e apenas ele) poderia ser em ação simples, sendo os subseqüentes obrigatoriamente em ação dupla.

Derivada dela houve também uma versão melhorada, originalmente destinada para exportação aos EUA. Esta versão, que usava a marca comercial "Tiger", possuía uma trava de desmontagem no meio da armação, sendo que seu desenho foi, na verdade, uma adequação às novas e rígidas regras norte-americanas do Gun Control Act de 1968. A INA fabricou também alguns (raros) exemplares desta arma que foram destinados às vendas internas.

Outra lenda urbana (ou não?) corrente entre os colecionadores seria que a INA teria fabricado protótipos de pistolas tipo Colt 1911 em .45 ACP, embora não se conheçam fotos ou o paradeiro das mesmas...

A CZ-45, fabricada na atual República Checa, cal. 6,35mm, na qual a INA Chanticler foi baseada.

O fim das atividades da INA, em 1972, foi inglório. A fábrica, que no final da produção ocupava também um terreno em Ribeirão Pires, foi lentamente estrangulada por dívidas, insolvência de órgãos públicos (existem até teorias que “forças ocultas” governamentais fizeram de tudo pra evitar que a INA sobrevivesse), e sem poder mais exportar, acabou falindo.

20 comentários:

  1. Parabéns pelo blog, Fábio! Conteúdo e forma bem casados ;-) Abraço do Fernando

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  2. parabéns fábio, mto interessante esse teu blog, t desejo mto sucesso!!!

    bjs

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  3. Possuo um revolver Taurus 38 SPL de seis tiros, é idêntico ou INA de exportação da foto, será que é uma cópia, ou a Taurus deu continuidade ao modelo, que por sinal acho muito bom?

    Fábio Costa : Caro amigo, tanto o revólver Taurus como o INA “Tigre” são cópias do Smith & Wesson Mod. 10 (military and police), daí se parecerem. A Taurus não deu continuidade ao modelo da INA, pois se iniciou na fabricação de armas no fim da década de 40, depois do fim da Segunda Grande Guerra, ao passo que a INA iniciou sua fabricação de revólveres somente na década de 1960.
    Grato pela visita.

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  4. Antes de mais nada, PARABÉNS, PELO EXCELENTE TRABALHO DA MEMÓRIA DAS ARMAS BRASILEIRAS (fabricadas no Brasil e pelo Brasil). Mas escrevo para dizer que tenho um INA cal. 32 de 3 pol, exatamente igual ao da foto, inclusive a empunhadura e realmente é uma excelente arma, muito macia e precisa. Porém uma coisa me intrigou, os INAs em cal. 38 (pelo texto) não fora feitos com canos de 4 pol. pois na época era o comprimento de cano dito para policiais, tamanho compacto e com maior precisão, inclusive foi a época em que foram os textes do FBI quando adotaram os smiths em calibre 9 mm com cano de 3 pol. - Assim, pergunto so existiram INAs de 2,3 e 6 pol ? ... Antes de mais nada, não me considero um colecionador, embora tenha algumas peças "legalizadas" e dentro daquilo que deicidi por mim prioriso as nacionais que me orgulho. Caso conheça alguem que tenha um INA cal 38. com 4 ou 6 pol. e queira se desfazer, poderiamos conversar.

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  5. Parabens pelo blog será que a I.N.A., não fabricou espingardas também?
    vc se lembra daquela marca esponhola
    de armas TANQUE sabe algo mais sobre
    elas, Obrigado.

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  6. Muito bom o seu blog, tenho um tigre cal 32, identico a esse..

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  7. parabens tenhu uma 635 dessa identica muito linda
    queria saber um pouco sobre ela e achei aki

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    1. Caro amigo, infelizmente não tenho como contata-lo, mas gostaria de saber mais detalhes, e se possível ver fotos desta INA 6,35. Estou transformando o blog em livro e necessito de fotos e dados.
      Agradeço.

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  8. Infelizmente maus brasileiros se dobraram as forças ocultas ,que tentaram,e aindam tentam sucatear a industria e os interêsses da nação, parece que com a INA foi o mesmo.
    Parabens pelo resgate histórico de nossa industria de armas.

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  9. Parabens pelo blog. Somente assim a memória nacional não se perde pelas brumas do tempo. Algun dos felizes proprietários dos revólveres INA possuem o manual da arma? Sou estudioso de armas & munições. contato gilmar.pc@hotmail.com. Grato.

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  10. JAMAIS IMAGINEI ENCONTRAR ALGO TAO INTERESSANTE. TRABALHEI NESTA EMPRESA POR 4 ANOS , ATE SER DECRETADA SUA FALENCIA. DEVOU MUITO A "INA" AO QUE APRENDI NA AREA DA INDUSTRIA MECANICA.

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  11. MUITO BOM O SEU BLOG. TODAVIA QUERO CORRIGIR, A BEM DA REALIDADE, QUE O VERDADEIRO PROJETISTA DA MTR DE MÃO INA .45 FUI EU, PROJETADA POR MIM NA FABRICA DE ARMAS DE ITAJUBA, ÉPOCA EM QUE EU ERA CAPITÃO ENGENHEIRO DE ARMAMENTO, FORMADO PELO IME 1947, ANTERIORMENTE CHAMADA DE ESCOLA TÉCNICA DO EXERCITO. LÁ ESTAVA QUANDO O CEL PLINIO LEVOU UMA MTR DE MÃO DINAMARQUEZA, COMO PROTOTIPO, PARA SERVIR DE MODELO, DENTRE OUTROS, PARA A FUTURA MTR DE MÃO BRASILEIRA.
    FUI DESIGNADO ENTÃO, PELA DIREÇÃO GERAL DA FABRICA, PARA PROJETAR A MTR DE MÃO BRASILEIRA.
    O PROTOTIPO DA MTR DE MÃO .45, DEU MUITO TRABALHO E FOI APROVADO PELA ENTÃO DIRETORIA DE FABRICAÇÃO QUE MAIS TARDE FOI FABRICADA PELA INA, EM SANTO AMARO EM 1950.
    FUI TRANSFERIDO DE ITAJUBÁ PARA A INA COMO DIRETOR TÉCNICO. HOUVE MUITO TRABALHO TÉCNICO, PROBLEMAS COM A POLVORA, COM A EJEÇÃO DOS ESTOJOS APÓS O DISPARO, SÉRIOS PROBLEMAS COM O MOMENTO FLETOR NO BOCA DA ARMA E NO MOMENTO DA SAIDA DO PROJETIL IMPULSIONADO PELOS GAZES.
    A 1ª ARMA FOI EXPERIMENTADA NO NOSSO STAND DE TIRO PELO MARECHAL ESTILAC LEAL E ACOMPANHADO PELO MARECHAL LOTT.
    FUI CONTEMPLADO COM A ARMA Nº5, HOJE DESATIVADA E PERTENCENDO À MINHA COLEÇÃO DE ARMAS COM O CONHECIMENTO E AUTORIZAÇÃO DO EXERCITO.
    FICARIA GRATO SE O QUE AFIRMO FOSSE LEVADO EM CONSIDERAÇÃO. O GRANDE AMIGO E EXECELENTE ENG. DE ARMAMENTO CEL PLINIO, PROJETOU OUTRAS ARMAS EFICIENTES NAS SUAS ATIVIDADES COMO DIRETOR GERAL DA INA.

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  12. Caro Cap. Euclydes.
    Apenas repeti o que se encontra na literatura especializada sobre as armas nacionais, ou seja, quase nada...
    Se o Sr. participou da criação e do "abrasileiramento" da Madsen/INA (calibre, mudança da alavanca/janela de ejeção, etc,etc), é uma honra conhecê-lo. É uma pena que os técnicos e projetistas da maioria das fábricas nunca tenham seu nome conhecido.
    Gostaria de mais detalhes desa historia.
    Abraços

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  13. parabéns pelo blog FABIO , muito bom , gostei muito mesmo .

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  14. PARABÉNS PELO BLOG SOU FÃ DE CARTEIRINHA DAS ARMAS DA MARCA INA ,EM ESPECIAL DOS REVÓLVERES MODELO TIGRE,EM CALIBRE 32 SMITH WESSON LONG E 38 SPL,POIS ELES POSSUEM UMA EXCELENTE QUALIDADE DE FABRICAÇÃO E TAMBÉM UMA MECÂNICA MACIA E PRECISA DE EXCELENTE QUALIDADE O QUE COMPROVA QUE O REVÓLVER INA TINHA UMA QUALIDADE ESTUPENDA,MUITO BOA MESMO.ABRAÇOS.

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  15. Algumas dessas fábricas antigas (Rossi ou Castelo) possuía inscrição, um logotipo? Tenho uma garrucha obsoleta com a inscrição "W" na alavanca do cano, não há mais nada escrito que possa identificar o fabricante.

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  16. Parabéns pelo blog Fábio!
    Tenho uma relíquia dessa em casa, um 32 I.N.A o dedal serrilhado por algum motivo perdi, de tanto tempo guardado o tambor está travado, vou mandar restaurar ele, saberia me dizer o valor dessa arma nos dias atuais?! Obgd.

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  17. show de matéria...
    Hurra Cap Euclydes

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